Queridos Escritores: Kathryn Erskine

Como eu ainda estava no clima de Passarinha, resolvi presentear o retorno da nossa coluna Queridos Escritores com a presença de uma pessoa que conseguiu entrar no ônibus já sentada na janelinha, apesar de eu ainda não ter lido nada além do lançamento da editora Valentina (mas pretendo mudar esse fato em breve): Kathryn Erskine.


Mencionei para vocês que essa coluna pode tomar diversos formatos, mas hoje optei pela forma tradicional de biografia mesmo, para acentuar o tom vintage da ideia que ressurge das cinzas. Só espero que vocês não pressuponham simplesmente que eu fui pelo mais fácil, porque eu garanto que sempre faço questão de me basear em um montão de pesquisas antes de vir encher os ouvidos de vocês de besteiras.


"Eu cresci na Europa, África, Canadá e Estados Unidos, e me torneI uma advogada antes que eu descobrisse o que eu realmente queria ser quando crescesse - uma escritora! Eu tiro minha instpiração do mundo em minha volta e de minhas experiências pessoais, incluindo minha infância passando por 8 escolas diferentes!
Eu viajo bastante, faço palestras, visito escolas etc. e tendo correr atrás do meu blog e do meu site no meio tempo. O tempo de escrita é precioso - atualmente estou trabalhando em diversos livros infanto-juvenis e young adult, assim como livros de fotos e um romance adulto. Meu próximo livro, SEEING RED, será publicado pela [Editora] Scholastic no outono de 2013*."
 * o livro foi lançado em 24/09/2013. FONTE: http://www.amazon.com/Kathryn-Erskine/e/B001JRWIQ2


Por algum motivo, não importa quanto eu tenha procurado, não consegui nenhuma informação concreta sobre o nascimento de Kathryn Erskine. Nem uma data, nem um ano, nem mesmo uma idade que me permitisse fazer as contas. Apenas um local: Holanda.

Apesar disso, ela não permaneceu lá por muito tempo, passou por 8 escolas diferentes no decorrer da infância e morou em diversos países ao longo da vida: Israel, África do Sul, Escócia (onde frequentou um internato que, pelos relatos dela, lembra muito a nossa escola de Magia e Bruxaria do coração) e Canadá, até chegar à Virginia, Estados Unidos, onde mora hoje com o marido e os dois filhos.

A Kathryn começou a vida profissional como advogada (coleciono autores-advogados), antes de se dar conta de que o que ela queria mesmo fazer era outra coisa: escrever. Desde então ela vive dando palestras e escrevendo seus livros, que já são cinco: Seeing Red, The Absolute Value of Mike, Mockingbird ("Passarinha"), Quaking e Ibhubesi: the lion. Infelizmente, até agora apenas Mockingbird foi traduzido para o português e lançado recentemente no Brasil pela editora Valentina.

Uma curiosidade que eu acho muito legal destacar (principalmente porque já resenhei Passarinha aqui no blog) é que a filha da autora tem Aspeger. Foi daí que surgiu a ideia para a personagem principal do livro, Caitlin, e no processo de construção a Kathryn entrevistou diversas pessoas afetadas pela síndrome.

Pela escassez de informações que encontrei na internet, fiquei impressionada com a discrição dessa autora. Admiro a forma como ela sabe preservar sua privacidade. Apesar disso, ela não nos deixa sem informações interessantes: em seu site, ela disponibiliza até playlist para os livros! Fechando a coluna de hoje, confiram abaixo duas entrevistas com a autora, uma em vídeo (que, infelizmente, não tem legenda, mas recomendo que quem entender inglês assista) e outra traduzida por mim sobre o livro Passarinha (devidos créditos no final).


Entrevista sobre o livro "Passarinha", por Eisa Ulen

Eisa Ulen: A protagonista feminina do seu livro, Caitlin, tem Síndrome de Asperger, uma condição que sua filha também tem. Em "Passarinha", Caitlin tem que lutar para se relacionar com seus colegas de classe, que a marginalizam. As experiências da Caitlin são similares às experiências da sua filha? O que sua filha acha da sua caracterização do mundo interior da Caitlin?

Kathryn Erskine: Algumas das experiências são similares, mas principalmente eu fiz muitas pesquisas - lendo, indo a workshops, conversando com pessoas afetadas pelo Asperger - porque eu queria fazer a história o mais universal possível. Todas as crianças são diferentes, tanto quanto cada criança com Asperger é diferente, apesar de haver alguns traços que são similares e que são usados para definir a condição, como por exemplo reações (exageradas) ao barulho ou ao toque, falta de contato visual, dificuldade em situações sociais etc. Eu fiquei contente, entretanto, quando minha filha leu o livro e disse que ela o achou uma descrição muito precisa da forma como crianças com Asperger veem o mundo.

E.U.: O filme ganhador do Oscar em 1962, "O Sol é Para Todos"* aparece com destaque em seu livro. Assim como o romance de Harper Lee vencedor do Prêmio Pulitzer, no qual o filme é baseado, "Passarinha" é um Bildungsroman** que explora temas de coragem e compaixão, ou o que Caitlin chama de empatia. Quando você leu "O Sol é para todos" pela primeira vez e por que você acha que esse livro significou tanto para você?

K.E.: Eu li "O Sol é para todos" pela primeira vez quando eu tinha por volta de oito anos. Minha irmã mais velha, uma professora nata, havia lido e insistiu que eu o lesse. Eu amei. Eu acho que nós duas nos identificamos com o livro porque, como Jem e Scout, ela era alguns anos mais velha do que eu e era uma irmã do tipo faça-a-coisa-certa, como Jem, e eu era mais menina-moleque que às vezes se metia em encrencas, como Scout. Também, havíamos nos mudado recentemente da África do Sul, que vivia sob o regime do Apartheid, e entendíamos a injustiça da segregação racial. Eu me lembro de me sentir tão orgulhosa quando descobri que era Americana e anunciar para minha mãe que nós não tínhamos apartheid no nosso país. Eu nunca vou esquecer a resposta dela: "Sim, nós temos. Só não chamamos assim". E eu nunca vou esquecer quão arrasada eu fiquei em descobrir essa verdade sobre o meu próprio país. Na verdade, esse é o tema do romance que eu acabei de terminar de escrever (provisoriamente intitulado Encarando a Liberdade***).

E.U.: Você disse que o tiroteio de 2007 na Virginia Tech a levaram a escrever "Passarinha". Devido ao fato de o atirador ter um histórico de doença mental, muitos americanos usaram o incidente para enfatizar os problemas em nosso sistema de saúde, especialmente no que se relaciona ao tratamento da saúde mental. A sua novela é, de alguma forma, uma resposta a esse discurso?

K.E.: Eu realmente acredito que a intervenção precoce (e contínua) é a melhor forma de se lidar com qualquer problema, incluindo questões de saúde e de saúde mental. Eu não posso evitar pensar que se o atirador tivesse recebido atenção mais cedo, e tivesse sido monitorado durante sua infância e adolescência, talvez as coisas não tivessem evoluído até uma conclusão são horrível. Foi por isso também que eu fiz da Sra. Brook um personagem proeminente em "Passarinha", porque eu quero passar a mensagem que, especialmente em um tempo de cortes no orçamento, nós precisamos de conselheiros em todas as escolas porque eles ajudam todos nós a nos relacionarmos e entendermos uns aos outros.

E.U.: Eu tenho uma prima com Síndrome de Williams e a mãe dela não permite que outras pessoas usem o que ela considera linguagem ofensiva. Por exemplo, se alguém diz de brincadeira "isso é tão retardado", ela calmamente fala a essa pessoa que considera sua linguagem inaceitável. Eu pensei nela quando eu li a cena na aula de educação física no capítulo "é coisa de menina" e em todas as vezes que a Caitlin questionou o sentido de palavras como "especial" e "autista". É o seu objetivo que os leitores observem a linguagem e os rótulos de forma diferente depois de ler "Passarinha"?

K.E.: Sim. De fato, eu adoro o que meu pediatra falou quando minha filha foi diagnosticada: "não importa do que a gente chame isso. Vamos apenas chamá-la pelo seu nome". Eu adoro a ideia de focar na pessoa, não em qualquer rótulo que alguém possa ter dado a ela. Rótulos despersonalizam a pessoa. É fácil para as crianças usarem palavras como "retardado" ou "especial" para debochar das pessoas. Quando eles conhecem a pessoa e entendem porque a ela agiu de determinada forma, não é tão fácil. Na verdade, eu preciso contar essa história que eu ouvi de uma mãe que leu "Passarinha" para os filhos. Quando seus filhos gêmeos estavam em um acampamento com um garoto autista que reagiu em uma situação que surpreendeu as outras crianças, os gêmeos não apenas aceitaram o menino como ele era, como também difundiram isso ao explicar a reação dele às outras crianças. Essa história foi tão gratificante que encheu meus olhos de lágrimas - porque foi exatamente para isso que eu escrevi esse livro.


* traduzido no livro como "Matar Passarinho" 

** Bildungsroman é um tipo de romance que se caracteriza pela formação do protagonista e do leitor nos princípios do humanismo, produzindo uma tentativa de síntese entre práxis e contemplação. Fonte: http://www.fflch.usp.br/dlm/alemao/pandaemoniumgermanicum/site/images/pdf/ed2005/Para_uma_interpretao.pdf

*** Lançado sob o nome IBhubesi: the lion.

4 comentários:

  1. Paloma, não conhecia nada sobre a escritora e por isso adorei o post. Estou louca para ler Passarinha e agora que li a entrevista sobre o livro quero mais ainda!

    Abraços, Isabela.
    www.universodosleitores.com

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    1. Que bom, Isabela! Tomara que você tenha a chance de ler logo. O livro é lindo e essa escritora é realmente muito especial.

      Abraços.

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  2. É interessante conhecer escritores. Estou querendo MUITO ler Passarinha, e sua entrevista me deu mais certeza que ele merece ser lido =)

    Beijinhos,
    www.procurei-em-sonhos.com

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    1. Também acho, Cássia. Conhecendo os escritores, de certa forma nós entendemos melhor as obras, né? Leia sim, não vai se arrepender.

      Beijos.

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